Tentei manter a regularidade das postagens aqui, mas a minha casa/vida virou a Praça É Nossa nas últimas semanas. Alguns dias depois que meus pais foram embora, meus sogros chegaram para fazer uma visita quase surpresa. Como eu nunca os tinha visto pessoalmente, tive que dar uma atenção maior e minha rotina foi para o saco de novo.
Recentemente tenho estado um pouco reflexivo e introspectivo, parece que vida tem demorado a me dar presentes, ultimamente só pago boletos.
Como alguns de vocês sabem, abandonei a estabilidade no Brasil para me arriscar na Austrália, que funcionou por determinado tempo, mas teve seu fim. E agora tento novo recomeço em Barcelona. Os três primeiros meses não foram fáceis.
Antes de vir pra cá, tirei férias no sudeste asiático para recuperar a energia. Como viajei com empresas baixo custo e estava mochilando, não podia carregar muito peso, então em Novembro tive que despachar minha mala de navio de Sydney para Barcelona. Assim que pus meus pés em território espanhol, em Janeiro, tomei uma porrada do frio. Carregava comigo apenas uma mochila e uma jaqueta de couro inútil. Minha mala só chegou na Espanha semana passada, 6 meses depois do despacho, e ainda está presa na alfândega.
Como não tínhamos encontrado lugar pra ficar, acabamos na casa de (quase) amigos por um mês. Nos dois meses seguintes vivemos uma vida de cigano. Depois da casa dos quase amigos, fomos parar em uma semi-república dividindo apartamento com um casal venezuelano esquisito e duas americanas porcas. No mês seguinte paramos em um apartamento em que morava um casal ok e um árabe picareta e avarento que batizava com vodca os vinhos das mulheres que ele levava pra casa e na manhã seguinte devolvia o vinho que não foi tomado de volta pra garrafa.
Quando finalmente conseguimos encontrar uma casa não compartilhada, quase caímos duro com o estado que os últimos inquilinos a deixaram (não pudemos fazer vistoria antes). Era tão nojenta que quase pedi meu depósito de volta, mas ao pensar em toda via sacra passada dos últimos meses, apenas solicitei que o proprietário contratasse uma empresa de limpeza e desse um jeito naquilo. Algumas coisas foram arrumadas, outras nem tinha como. A pia da cozinha, se você abre muito a torneira toma-se um banho de pombo, a casa é tão pequena que se peido na cozinha, acordo minha namorada no quarto. O chuveiro precisa que o ralo seja limpo de vez em quando, pois do contrário no final da semana o box vira a piscina do Gugu e acumula uma chumaço de cabelo molhado nojento.
No último mês, depois de bater muita cabeça, arrumei trabalho numa multinacional que parece uma torre de Babel. É gente do mundo inteiro, das mais diferentes histórias de vida e perfis. Obviamente paga-se bem menos que muito trabalho ordinário na Austrália e exige muito mais, seja de capacitação como de dedicação.
Olhando essa descrição, a minha vontade é de pegar o primeiro voo e voltar para o Brasil. Porém, nesses momentos é preciso ter sangue frio e pensar racionalmente.
Li recentemente uma frase de Carlos Drummond bastante apropriada para esse momento: “A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade. A dor é inevitável. O sofrimento é opcional”.
Olhando em outra perspectiva, esses últimos meses não foram ruins.
Fizemos uma viagem inesquecível pelo sudeste asiático. Chegamos na Espanha e nos surpreendemos com a hospitalidade de pessoas que não tinham motivo algum para nos receber e ainda assim nos trataram como se fossemos da família.
Nossa vida em república não foi um mar de rosa, mas vivenciamos histórias hilárias e piadas que levamos pra vida, além de ter vivido em diferentes bairros de Barcelona e conhecer a cidade melhor.
Nosso apartamento é pequeno, mas fica a 1 minuto da praia, em um bairro pequeno e charmoso que todo mundo acaba se conhecendo e de fácil acesso aos principais pontos da cidade e trabalho.
Falando em trabalho, por ser uma torre de babel, pratico espanhol, inglês e francês o tempo inteiro, o que em breve me fará poliglota. O salário não é bom, mas a perspectiva de crescimento é enorme e as minhas contas são pagas.
Atualmente, minha vida não é maravilhosa e está longe do que eu planejava, mas eu ainda olho pra trás e tenho orgulho dos tropeços e conquistas. Sem dúvida, a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional.