Como estava sem inspiração para escrever, perguntei às leitoras no Facebook que assunto gostariam que eu escrevesse. Fiquei surpreso com a quantidade de solicitações sobre como lidar com diferenças de classes sociais. Aqui há duas possibilidades, a pessoa que possui melhor condição financeira e a que possui menor. Como já vivi os dois lados, abordarei ambas experiências.
Fato é, ninguém gosta de parecer feio, burro e pobre. No primeiro encontro (via de regra) as pessoas usam sua roupa mais bonita, tentam causar boa impressão no papo e mostrar que não são um fudido. Claro, só um abobado vai falar que é rico ou pobre logo de cara, mas ai as questões de o que você faz, onde mora, formação, etc começam a delinear quão duro ou abastado é fulano.
No meu caso, no começo da minha fase adulta eu era meio fudido, tinha um carro caindo aos pedaços, usava roupas horrorosas e a grana que sobrava para as garotas que eu saia mal pagava a gelada do bar da esquina. Com muita criatividade eu contornava a situação e evitava mostrar a minha condição fudida. Só que isso me atraia nada que prestava. As pobres como eu me achavam esnobe, as mais abastadas não me correspondiam depois de alguns encontros. Eu passava uma imagem superficial e só fidelizava tranqueira, sejam pobres interesseiras ou ricas burras.
Após alguns anos trabalhando e fazendo algum dinheiro eu comecei a mudar minha percepção e estava cagando para a questão financeira, mas eu seguia não querendo uma pobre interesseira ou uma burra rica do meu lado.
Minha primeira ex não tinha muita condição, na verdade a família dela chegou a ter bastante dinheiro, mas perdeu tudo. O mais triste nesses casos é a tentativa de manter o padrão de vida antigo fazendo remendos com a condição atual. A primeira vez que conheci os pais dela parecia um teatro. Todos vestiam roupas de marca gastas (e/ou falsas) falavam de dinheiro e bens quase que a janta inteira. As perguntas que dirigiam a mim era para certificar que eu tinha grana e uma vez passado no filtro financeiro-social, me tratavam com uma submissão e adulação que me faziam mal. A minha ex era boazinha e trabalhadora, me dava pena da família ser tão inconveniente. Nossa relação não deu certo por alguns fatores, mas a família foi um peso importante.
Alguns anos depois conheci outra ex e a coisa inverteu. Ela tinha uma condição muito superior a minha, que eu apenas fui tomar conhecimento meses depois de nos conhecermos. A coisa foi meio nerd, nos conhecemos online e depois de alguns meses pessoalmente. Eu tinha um tesão imenso por ela e não me preocupei em levar em restaurante no primeiro encontro ou mostrar status, convidei-a para comer sanduiche em casa (que naquela época era bem simples) e foi um encaixe explosivo.
Quando a conheci eu era um ogro, não tinha muito conhecimento de etiqueta, desconhecia um monte de comida refinada e vinhos, que ela me ensinou com bastante paciência. Por outro lado, ela não tinha a vivência de cozinhar a dois, de ir a festa popular, de pagar a conta, e se divertir com coisas simples como tomar um vinho de 30 reais no parque. Então, nossa diferença financeira-social era contornável com um mútuo aprendizado, isso fez muita diferença.
A família dela, por outro lado, não dava a mínima pra mim. Minha presença era simplesmente dispensável e quando a mãe dela tomava umas e outras, eu recebia algumas alfinetadas de que eu não era tudo isso pra filha dela. Como vivíamos longe um do outro, a família não exercia muita influência na relação, mas eu tenho certeza que seria um potencial problema se a coisa avançasse.
Enfim, se o cara te escolheu como parceira, ela sabe qual a sua condição e te aceita por isso. Não sejamos hipócritas, é ótimo tomar champanhe nos alpes franceses degustando um bom fondue, mas também é incrível cozinhar em casa uma feijoada no fogo lento ao som de Natiruts. Como eu disse, questões como “não consigo frequentar os mesmo restaurantes, viajar, etc” são contornáveis com programas mais simples ou eventualmente a pessoa que possui mais dinheiro bancando um capricho. O dinheiro nos permite experiências únicas, a criatividade também.
Quando me perguntam se a diferença social pesa em uma relação, considerando pessoas maduras e sem complexo patriarcal, eu costumo dizer que pesa mais com quem está fora pra quem está dentro. Se há diálogo entre o casal e ambos reconhecem a diferença social, o único problema é a família, que na minha atual e racional opinião pode ser resolvido simplesmente evitando-a.