A Publicidade as vezes me cansa. Apesar de ser formado na área (ou talvez por ser formado na área) mais da metade do que vejo de anúncio me desgasta. Falta bom senso em todos os lados, do conteúdo ao formato. O Youtube é um dos casos que mais incomoda, pois eu não tenho a opção de simplesmente virar a cara para outro lado, como no caso do outdoor, ou simplesmente mudar a estação do rádio.
Faço minhas listas de clipes de rock no meu canal para ouvir enquanto estudo (ou lavo a louça) e de repente sou interrompido por uma propaganda tosca, sem nenhuma relação com rock e que em boa parte das vezes não disponibiliza o milagroso botão “pular anúncio”. Hoje, por exemplo, tive que esperar uma eternidade, enquanto duas crianças brincavam com vaquinhas de plástico (essa foi a última propaganda de sorvete que me enfiaram goela abaixo em pleno inverno australiano).
O post não é sobre Publicidade, mas há um conceito básico na área perfeitamente aplicável no nosso cotidiano, que sãos os Emissores e Receptores de informação. Já explico. Antes contarei dois casos.
Estava eu quietinho no meu canto da sala de aula, com fones de ouvido e a mochila estrategicamente colocada na única cadeira ao meu lado para que ninguém me perturbasse, quando a Maria apareceu e perguntou se poderia sentar ali. Não seria muito educado negar e minha mochila cedeu o lugar. Não deu dois minutos até que ela puxasse assunto e fizesse com que meus fones de ouvido cedessem lugar aos seus problemas pessoais.
A Maria é uma colombiana simpática, mas que as vezes incomoda com a sua completa informalidade, falta de tato e foco. Ela está na Austrália há 4 anos e nesse período apenas trabalhou segurando placas de trânsito (um dos trabalhos braçais mais bem pagos por aqui). Nesse tipo de trabalho, você não conversa com ninguém, não pensa e fica horas em pé. Resumidamente, o inglês dela é ruim, ela não aprendeu nenhuma habilidade e agora precisa voltar ao seu país e se reposicionar no mercado de trabalho.
Maria perguntou se eu poderia revisar o currículo dela. O negócio era um desastre, tanto no formato quanto no conteúdo. O objetivo profissional estava: “Trabalhar na área financeira, realizar projetos de marketing e participar em projetos de design”. Na sequência vinha as suas “qualidades pessoais”, em que uma série de lugares-comuns foram despejados ali, me dando a impressão de um copiar e colar do Google. Depois vinha um samba do criolo-doido de experiências profissionais desconexas (ora mesclando com a Colombia, ora com a Austalia). Diante daquilo me senti como um cara questionado por uma mulher sobre o que ele achou do novo corte de cabelo, que mais parece saído de um pet-shop.
Na mesma semana recebo email de uma leitora chateada, pois o cara que ela sai só está a fim de comê-la. Na história ela relata que na faculdade ela focou praticamente o período inteiro no curso, em relacionamentos casuais e festas. Só que agora, pelo visto no final da faculdade, ela encontrou um cara que começou a sair apenas pelo sexo, mas acabou apaixonando-se. Ai ela me questiona se o “problema” é com ela ou com ele para que a coisa não fique séria. Dei uma fuçada no Facebook dela e ele comprova o que eu imaginava, muitas fotos na balada, decotes e milhares de selfies solitárias.
Mas o que a propaganda do Youtube, a minha amiga e a leitora tem em comum? Ambos são emissores de informação para um receptor, eu para a propaganda de sorvete, o recrutador para a minha amiga e o carinha para a leitora.
E o que esses emissores estão fazendo errado? Nenhum deles entende o seu receptor. Hoje é um dos dias mais frios aqui, são 15:00 e desde que acordei não tirei as meias do pé, estou praticamente sentado no aquecedor e a última coisa que quero ver na frente é algo gelado; minha amiga quer divulgar seu currículo como se fosse uma barraca de frutas; já a leitora quer mostrar que agora está disposta a namorar, mas toda a sua história recente e fotos dizem o contrário.
E a solução? Tive que praticamente refazer o currículo da minha amiga para que ele tivesse um foco; para a leitora, reveja a mensagem que está passando para o cara. Não há mal algum em ter tido uma fase de curtição e agora querer se aventurar em um relacionamento. Porém, não basta apenas querer, é preciso mostrar. Seja menos acessível em bootie-calls. Dê uma maneirada em fotos de balada, de decotes e selfie solitária. E antes que me acusem de machista, é só pensar no outro lado. O que você acharia de uma cara com selfies no espelho, fotos de sunga e na balada com amigos?; e finalmente, para a propaganda de sorvete, estou pensando em enviar o meu currículo para a agência de publicidade australiana. =D