Desventuras na Australia (parte III)

O verão finalmente chegou do outro lado do mundo, mas o inverno da minha vida ainda está demorando pra passar. Após tantas dificuldades que relatei nos dois últimos posts, achei que nada pior pudesse acontecer, mas a vida sempre encontra um jeito de me surpreender.

Começo da semana passada aproveitei que fazia 30 graus em Sydney, peguei minha bicicleta e fui até a praia, um percurso que leva uma hora. Lá aproveitei para deixar alguns currículos em hostels e fui tomar sol. Assim que deitei na areia senti algo de errado com as minhas costas. Depois de algumas horas lendo e descansando, levantei pra ir embora e senti uma fisgada na coluna. Peguei a bike e voltei. Dormi na minha cama pula-pula (tem mais mola que estofado) e acordei completamente travado, com uma dor insuportável. Tomei café tal qual o Joaquim Barbosa do STF e fui até a farmácia.

Lá comprei um anti-inflamatório que me deu uma reação alérgica e ganhei três aftas na boca, uma na ponta da língua que fez com que eu ganhasse um sotaque meio gay. A minha nova cama era o chão do meu quarto até que eu melhorasse (o que ainda não aconteceu). Pelo menos naquele dia eu fui chamado por uma agência de eventos e teria trabalho para o próximo final de semana.

Junto da marola da sorte, um hostel em frente à praia me chamou para um “trial” no dia seguinte. Lá seria uma baita oportunidade, pois além de acomodação eu ganharia um salário e conseguiria praticar outras línguas.

Cheguei no hostel e o gerente parecia uma mistura de Patropi com o Morto Muito Louco. Quando ele não estava brisando, falava coisas completamente sem sentido e/ou desconexas. Ele me levou para apresentar a estrutura do lugar e quase cai duro com a imundice. O lugar tinha o charme do Carandiru, mas habitado por ingleses e suecos (porcos). Era resto de comida e roupa por todos os cantos e a maioria dos quartos cheirava a mofo. Questionei qual era o quarto do staff (ou seja, o meu) e ele disse que variava toda semana, de acordo com a disponibilidade. Ali já dei uma brochada, mas esperei para ver como seria o trabalho.

Patropi me levou pra recepção e começou a explicar a operação do lugar. Fiquei feliz e aterrorizado. Feliz, pois como a minha última experiência na empresa que trabalhava era na área operacional, e já tinha identificado um monte de oportunidade de melhoras por ali sem nenhum custo. Porém, aterrorizei com tanta gambiarra que o cara fazia. Nada era centralizado. Parte das reservas ficava num excel (desatualizado), a outra em um livro e a outra na cabeça dele.

Achei que a bagunça fosse apenas pelo jeito doidão do cara, mas depois observei que ele utilizava a desorganização para fazer reservas sem registro e assim embolsar o dinheiro. Pensei em conversar diretamente com o dono do lugar, mas não iria arrumar essa briga recém chegado no país. Resolvi não ficar lá e seguir na minha busca.

Saindo desse hostel, vi um restaurante brasileiro, entrei e perguntei para a gerente (uma brasileira) se ela estava precisando de garçom. Ela respondeu que lá só trabalhava garçonete, mas que havia vaga na cozinha. Topei e ela me chamou para um trial no dia seguinte.

O dia do trial foi um dos mais quentes do ano, quase 40 graus. A cozinha era minúscula e a minha função qual era? Cuidar das frituras e louça. Juro, devia fazer mais de 45 graus naquele lugar. E presenciei na pele a velha máxima de não visitar cozinha de restaurante.  O óleo não devia ser trocado há semanas, o sal da batata parecia um pó químico que a menor brisa fazia todos na cozinha tossir de tão forte e refinado que era. Quando tirei a louça da máquina, os pratos e talheres continuavam engordurados, mas o “chef” respondeu que era só eu passar um pano que eles ficavam limpo. Visualmente estavam limpo, mas devia ter um monte de zica não visível.

Terminei o trial e fui conversar com a gerente. Ela perguntou quando eu poderia começar. Fiquei feliz, disse que na próxima semana, mas que gostaria de saber o salário. A mulher surtou. Disse que daquele jeito eu não arrumaria nenhum trabalho, onde já se viu eu atrelar meu início ao salário, que devia estar sobrando emprego pra mim e blablabla. Não entendi um cacete, será que eu deveria falar que sonhei a vida inteira em trabalhar numa cozinha minúscula fritando batata e que o salário é apenas um detalhe?

Respirei fundo mais uma vez e mentalizei que fim de semana haveria dois trabalhos bacanas que eu faria para a empresa de eventos.

O de sexta-feira foi legal. Era uma festa de confraternização de empresa e minha função era apenas servir champagne e polir taça. Moleza. Sai de lá feliz da vida, finalmente com grana no bolso e ansioso para o evento no dia seguinte.

Inicialmente o evento do sábado era um dos maiores festivais de música eletrônica da Australia. Mas um dia antes me realocaram para o show da Taylor Swift e no último minuto realocado para um evento de Motocross. No lugar só tinha homem esquisito e motoqueiro bebum. Ali eu iria trabalhar como caixa.

Uma das mentiras no meu currículo é que eu tinha experiência em caixa. Poxa, não seria tão difícil inserir o pedido no sistema, pegar o dinheiro e dar o troco, mas foi.

Eram apenas dois caixas e assim que cheguei a minha supervisora perguntou onde estava o meu dinheiro. Estava quase falando que na minha carteira, dentro da mochila, mas por sorte ela falou logo na sequência que eu precisava ir até o escritório pegá-lo. Era o dinheiro trocado para colocar no caixa. Peguei o dinheiro e comecei a trampar.

O sistema não era difícil de operacionalizar, mas sempre que alguém saia do convencional (como pedir para mudar o pedido depois que fechou a compra) eu tinha que consulta-la e sempre era um tormento. Ou ela respondia com grosseria ou não sabia e eu tinha que me virar.

Passavam-se as horas e o pessoal ia ficando bêbado e o sotaque mais carregado. A pressão pra entendê-los, uma supervisora mal educada do lado e horas em pé lidando com dinheiro foi mais uma lição de vida. O fechamento de caixa deu tudo certo e voltei pra casa morto.

Dia seguinte eu só queria ir pra praia,  beber e esquecer todos os perrengues. Fui com uma amiga do Brasil mais uns brasileiros e gringos. Acabei bebendo umas duas garrafas de vinho branco e fiquei pra lá de Bagda. Já era quase 20:00 quando eles decidiram ir para um barzinho, e eu achei melhor ir pra casa. Dormi dentro do trem e fui parar quatro estações de onde eu deveria descer.  Como o bairro que moro há uma limitação de trens no fim de semana, o que eu estava era o último daquela noite e tive que pegar um Uber pra voltar pra casa. Por sorte todos em casa dormiam, mas acordei as 5:30 da manhã com a cabeça explodindo e uma das crianças na casa chorando porque o fim de semana tinha acabado. Por pouco não abri minha porta e fui chorar com ele.

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Essa semana volto com a programação normal do blog. Sugestões, rapidinhas do cafa, sexta das leitoras? Só mandar para cafa@manualdocafajeste.com

Desventuras na Austrália (parte 2)

(continuação do post anterior)

Pra poder trabalhar como garçom na Australia é preciso fazer um curso de “Serviço responsável de álcool”. Uma estupidez de 8 horas que basicamente lhe ensina que você não pode servir menores e pessoas alcoolizadas. O valor? Quase R$300,00. Mas considerando que um garçom faz cerca de R$450,00 por dia, até que é não é tão doloroso.

Terminei o curso e lembrei-me de uma rua simpática cheia de restaurantes que poderia ser um bom ponto de partida para despejar currículos (que obviamente estão cheio de experiências falsas em restaurantes brasileiros). Só que cheguei lá por volta das 16:00 e quase todos os restaurantes estavam fechados. Vi que dentro de um mexicano uma mulher varria o chão e toquei na porta.

Era a gerente, uma alemã. Ela olhou o meu currículo e ficou feliz de ver que estou estudando alemão e puxamos assunto. Ela comentou que no momento não havia vagas, mas que me avisaria caso surgisse. Dia seguinte, uma quarta-feira de manhã, ela me ligou pedindo para que eu fizesse um “teste” na sexta-feira e viesse com uma camisa branca. Ah, esses testes quase nunca são pagos, mas tudo bem.

Sempre subestimei a função do garçom. Especialmente nos botecos quando eles me ignoram pra trazer uma simples cerveja. É tanto detalhe, pedido, processo, regras, etc que você só passa a valorizar o trabalho quando entende os bastidores. “Aprendi” todos os truques da função com vídeos no Youtube e já me sentia preparado para arrebentar.

Na sexta-feira, dia da minha triunfal estreia, chovia muito em Sydney. No caminho para o restaurante lembrei da caralha da camisa branca, que eu não trouxe do Brasil, e por sorte tinha uma loja de departamento (tipo C&A) perto. Havia três tipos de camisa branca, uma que custava R$400,00, outra que parecia ter sido guardada dentro de uma caixa de fósforo e a terceira que eu parecia um vendedor de morangos (comprida na cintura e manga curta).

Bateu um desespero, pensei em ir com a amassada e falar que era o estilo da camisa, mas acho que não ia colar. Por uma luz divina, observei umas polos brancas em um cantinho da seção que eram bem baratinhas, comprei uma e um guarda-chuva para não chegar transparente no lugar.

Ao abrir a porta do restaurante, creio que tinham uns quatro pessoas lá dentro, além dos funcionários. Como é uma rua sem lugar pra parar (e sem vallet) a chuva afugentou boa parte da clientela. Encontrei a alemã, ela mal olhou na minha cara. Tive que relembrá-la sobre o “teste” e com a maior cara de pau ela disse que o combinado era sábado. Foi então que descobri o truque do “teste”, em que muitos gerentes pedem para as pessoas trabalharem de graça para dar vazão aos dias mais cheios e logo na sequência dispensam sem nenhum custo para o negócio. Ela poderia ter me explicado o funcionamento do restaurante já que não tinha quase cliente, mas como o objetivo era apenas dar vazão aos pedidos, eu não servia.

Sai de lá, respirei fundo e não deixei me abater pela derrota. Lembrei-me de uma churrascaria brasileira que um amigo havia comentado que eles sempre contratam brazucas. Cheguei no lugar e fui bem recebido por um garçom brasileiro que me explicou que provavelmente haveria vaga na próxima semana. Nisso apareceu o gerente, um chinês, que parecia o Cebolinha falando inglês. A entrevista foi bizarra porque eu mal entendia o cara e pelo visto ele deve ter pensado que meu inglês é uma merda.

Por fim, fui até uma agência de “hospitalidade” que recruta pessoas para trabalhar em grandes eventos. Chegando lá a atendente perguntou se eu dominava a técnica dos “três pratos”. Como eu já tinha assistido no Youtube um vídeo a respeito, falei de peito cheio que sim. Ela me chamou para uma salinha que havia uma caralhada de copos, talheres e pratos e pediu que eu apresentasse a técnica. Fiz daquele jeito, meio nervoso. Na sequência ela pediu que eu levasse taças para uma mesa fictícia e servisse vinho e depois que eu montasse uma mesa (com aqueles milhares de talheres). Nessa hora falei que não tinha ideia de como montar. A mulher foi complacente, disse que eu preciso de mais prática e que voltasse lá depois de três meses.

Completamente derrotado, sem conseguir trabalhar como pedreiro e inexperiente para garçom fui naquela sexta para a casa preparar o meu jantar sozinho, já que a família tinha saído para uma festa em outra cidade. Comprei um vinho no caminho e liguei o som pra cozinhar o prato que venho comendo há um ano, frango com salada e arroz integral.

Mal piquei a cebola e começou a tocar “Garota de Ipanema” na rádio. Nessa hora lembrei-me de tudo o que tinha deixado para trás, a situação que eu estava e confesso que a cebola ardeu meus olhos. Respirei fundo de novo, tomei um bom gole do vinho e voltei a cozinhar. No final do jantar só tinha um quarto da garrafa e fui tomar banho pra baixar o álcool.

Cheguei no banheiro e vi que o suporte do papel higiênico tava meio triste, pendendo pra baixo, quase derrubando o rolo. Tentei coloca-lo pra cima e o suporte quebrou na minha mão. Nem objetos inanimados estavam me ajudando.

Aproveitando que estava sozinho, dirigi-me à banheira pra ficar lá de molho e sem querer chutei o ralinho do banheiro, que era mal desenhado, e caiu dentro do buraco. Coloquei um saco plástico na mão e resgatei a tampa do ralinho. Veio tanto cabelo com nojeiras grudadas nele que parecia que eu segurava uma Barbie do inferno. Limpei aquilo, coloquei-o no lugar e finalmente tive o descanso que precisava.

Eu nunca me iludi sobre morar fora. As fotos de cangurus fofos, as praias maravilhosas, o céu incrível, etc, etc é a ponta mais bonita do iceberg que boa parte das pessoas que tentam a vida no exterior mostram no Instragram/Facebook. Quase ninguém tira foto da maloca que dormem, quebrando calçada com britadeira, trabalhando de madrugada, dos pratos de comida paupérrimos e por ai vai. No fundo até entendo essas pessoas, pois sempre tem alguém julgando quem saiu do país e mais atrapalhando que ajudando com o discurso de dó travestido de motivacional.

Abandonar o seu país para viver fora é como romper um casamento que não tá legal e voltar ao clube dos solteiros. É ter coragem de reconhecer que a relação não está boa, que a zona de conforto não compensa todos os problemas diários, romper, e como diz o Dinho, reaprender a andar descalço em um mundo de asfalto. O mais importante é ter um objetivo em mente e prazo (razoável), ter paciência com a readaptação e ir superando cada fase. No final, se não der certo, é só redefinir o objetivo, mas a jornada já valeu a pena.

Desventuras na Australia

Desculpem o sumiço, mas ultimamente ando sem tempo e inspiração pra escrever sobre relacionamentos. As minhas primeiras semanas na Australia não foram fáceis e até hoje ainda mato um leão por dia para recomeçar a vida. Preciso desabafar um pouco e por isso escreverei sobre o que rolou recentemente. Já aviso que o post de hoje não tem romance.

Mentira. Até tem um pouco de romance. Deixei no Brasil uma pessoa que curti bastante e fazemos planos de nos reencontrarmos em breve, por isso estou no modo inativo do outro lado do mundo. Mas não por isso que meus dias tem sido menos tumultuados. Tudo começou antes mesmo de embarcar.

Um dia antes da viagem me dei conta que a empresa de seguro de saúde (item obrigatório para entrar na Australia) fez lambança na minha reserva e eu estava descoberto por duas semanas. Tentei entrar em contato com eles, mas era uma sexta-feira a noite e o escritório já tinha fechado. Peguei o avião com o risco de ter dor de cabeça na alfândega e não conseguir entrar no país.

Tentei relaxar no avião, mas a todo momento vinha na cabeça a preocupação com a fronteira. Depois de uma hora de vôo, tentei relaxar e pedi duas garrafinhas de vinho. Coloquei meu sapato embaixo do banco da frente, estiquei as pernas e coloquei uma música pra descontrair. Tava gostoso. Mas de repente começou uma muvuca de comissários na minha frente, sendo que um deles trazia um cilindro de oxigênio. A senhora que estava na poltrona da frente apagou. Uma das comissárias pediu a gentileza que eu saísse da minha poltrona para ajudar na movimentação e quando eu peguei meu sapato, estava embebido em vomito da mulher. Morrendo de nojo sai correndo para lavá-lo no banheiro, mas era de camurça e a senhora tinha vomitado vinho. Não aconteceu nada com a velhinha, acho que passou mal com o vinho, já eu pisei na Australia com os pés sujos.

Por sorte a polícia não me parou, nem questionou os pés-de-moleque e espumante que eu trazia para a família que me hospedaria. Que vale uma menção à parte.

Eu estava procurando apartamentos para dividir, mas uma amiga disse que a melhor coisa seria ficar em algum lugar provisório para que de lá eu fosse fazer vistorias no lugar definitivo. Por recomendação dela, que já tinha ficado com essa família, acabei me programando pra passar um mês com eles. A experiência tem sido boa, mas com seus altos e baixos.

Eles são um casal na faixa dos 40/50 e possuem dois meninos na casa dos 10. Assim que cheguei, fui todo feliz dar pés-de-moleque como se fosse uma grande iguaria e ao olharem o doce, agradeceram com um riso amarelo e nunca ninguém tocou (só eu escondido para acompanhar meu café da tarde). Depois descobri que a minha amiga já tinha levado o doce certa vez e ninguém gostou por ter muito açúcar e grudar no dente.

Com o espumante foi um pouco pior. No dia seguinte eles fizeram um jantar para receber um casal de amigos mega finos e expert em vinhos. Eu tinha comprado o espumante no Brasil, em uma loja especializada , mas deixei-me levar pela opinião da vendedora, não olhei o rótulo direito e só me dei conta da porcaria que tinha comprado quando ao servir, as bolhas pareciam de água com gás e o gosto de suco de uva. Novamente risadinhas amarelas foram dadas e a convidada mal bebeu.

Passado esse trauma inicial, comecei a me entrosar melhor na casa. A “mãe” cozinha incrivelmente bem, é muito gente boa e pelo menos duas vezes por semana há festinha na casa deles ou de alguém da vizinhança para beber e conversar. Uma excelente oportunidade para afiar o inglês, integrar e fazer amizade.

Porém, as vantagens acabam por ai. Por mais que eu tenha o meu quarto e pague uma grana semanal, eu preciso seguir o ritmo da casa. Isso quer dizer, acordar as 6:30 da manhã com criança brincando, jantar as 18:30 (e morrer de fome as 21:00) e ter que ir deitar as 22:00 pra não fazer barulho. Fica difícil escrever nesse ritmo.

Como disse, estou inativo sexualmente, e nem sozinho eu consigo me aliviar. O banheiro e meu quarto não possuem tranca, logo não dá pra correr o risco de uma criança me pegar descascando banana. Resumindo, estou há 3 semanas castrado e com o risco iminente de uma polução noturna.

Mas acordado consigo me conter. O meu foco é encontrar um emprego e uma casa com pessoas da minha idade/situação, depois resolvo a abstinência. Só que até casa e emprego são um desafio a parte.

O problema com a casa é que estamos em alta estação e o preço do aluguel sobe absurdamente, mas com trabalho isso dá pra resolver. Só que isso é o que mais pega.

Sair do Brasil com um visto de trabalho australiano é tão raro como alguém vomitar no seu sapato e você lambuzar os dedos em vômito alheio. A diferença é que apenas o segundo aconteceu comigo. Nenhuma empresa patrocina alguém a distância sem conhecer o trabalho dela.

O caminho mais fácil é entrar com um visto de estudante, que permite trabalhar 20 horas por semana, e ai mostrar serviço nesse período e achar uma boa alma que pague o visto de trabalho. Com esse visto, é mais que meio caminho andado para pegar uma residência e cidadania.

Meu inglês está muito bom, mas quero deixa-lo excelente antes de aplicar para vagas na minha área. Por isso, estou buscando qualquer emprego braçal que me permita praticar o idioma. Além disso, um dos objetivos que estabeleci desde que sai do Brasil é não tocar nas minhas economias, então arrumar um trampo e zerar meus custos é o meu esforço diário.

A primeira oportunidade surgiu para ser pedreiro. A ideia inicialmente não me agradou, pois imaginem de diretor de operações há um ano e pouco, agora virar pedreiro no exterior. Porém, viver fora do país requer um exercício constante de humildade e quebra de preconceitos. E aquilo que não mata, vira experiência de vida. Lá fui eu pra obra.

Era uma baita mansão e no fundo havia uma montanha de terra. Eu era o único pedreiro no lugar e a missão era espalhar aquela montanha ao redor da casa em dois dias. Mentalizei que aquilo seria uma boa academia e eu ainda receberia pelo exercício. Coloquei uma música, tirei a camisa e fui com sangue nos olhos. No final do dia eu tipraticamente finalizei o trabalho de dois. Estava orgulhoso da minha produtividade, mas foi uma tremenda estupidez por dois motivos.

Primeiro que o pagamento é feito por horas trabalhadas, ou seja, eu poderia ter dado uma enrolada e dobrado o meu rendimento; segundo, eu arrebentei as minhas costas. Desde pequeno tenho uma zica que se eu faço muita força na coluna, fico todo torto. Para colocar a cereja no bolo de merda, tinham me falado um valor por hora e depois revisaram pra baixo como se eu não tivesse entendido o combinado. Esse tipo de desrespeito é comum por aqui.

Pelo menos em um dia consegui pagar o aluguel da semana, mas dia seguinte eu mal conseguiria levantar da cama. Deixei a ideia de pedreiro de lado e fui tentar a de garçom, onde ganha-se menos, mas usa mais o inglês. Achei que seria inofensivo, mas tive experiências piores que a de pedreiro.

(continua no próximo post)

Passeando com a fala mansa em São Paulo

Era uma noite de inverno paulista, faltavam duas semanas para eu iniciar minha viagem e já tinha dado início às festas de despedida. Meu amigo mais próximo convidou-me para um bar balada recém-inaugurado na capital, onde seria o aniversário de uma ex-peguete dele, que segundo me informou estava querendo voltar. Essa garota é uma modelinho, e por consequência, o lugar supostamente estaria repleto de pessoas do meio dela. Fui lá todo feliz atrás do cardume.

Chegamos à porta e deu uma dor no bolso, pois havia um mínimo de consumação de R$ 150,00. Respirei fundo e pensei “bom, esse é o preço que se paga para frequentar lugares onde vão modelos” e entrei todo feliz.

O lugar era bonito, bem decorado e espaçoso. Só que eu via apenas casais GLS e turma de menines. Comentei com o meu amigo que aquilo estava estranho. Depois de andar bastante finalmente encontramos a mesa da garota. Ela de fato trouxe todos os seus amigos do meio, cabelereiros, maquiadores, modelos homens, casais e apenas uma mulher que se fosse modelo, eu seria o Richard Gere. Detalhe, a ex-pequete do meu amigo estava com um cara. Não entendi um cacete daquilo.

Na mesa havia umas três garrafas quase vazias de vinho e pratos de porções quase finalizados. A aniversariante muito malandra disse que para “facilitar” a conta eles estavam juntando todas as comandas para depois dividir por igual com todos. Eu abomino essa prática quando há mais de quatro pessoas na mesa. Sempre tem o casal espertão da roda que pede a bebida mais cara, toma em maior quantidade, resolve sair um pouco mais cedo e deixa uma migalha de dinheiro para abater do final.

Eu não estava nem um pouco a fim de pagar lanche para pessoas que eu não tinha intenção alguma de agradar ou pegar, e gentilmente falei para ela não se preocupar, pois eu ficaria pouco tempo, já que tinha outro compromisso (mentira) e sairia mais cedo. Obviamente que todos me olharam como se eu fosse um mendigo. Dei a mínima.

Depois desse combo de alegria, falei que ia ao banheiro, dei uma piscada para meu amigo e insinuei discretamente que ele me acompanhasse. Ele não sacou o toque, e sim um dos maquiadores, que fez cara de desejo pra mim. No banheiro me enfiei em uma das cabines com receio que o cara viesse atrás do lado de mim no mictório, e enviei uma mensagem ao meu amigo para nos mandarmos dali assim que finalizássemos nossa comanda. O cara estava puto também pelo fato da garota estar acompanhada.

Meu a amigo e eu juntamos nossa comanda e pedimos uma garrafa de vodka para dar um up e já fazer esquenta para uma balada que iríamos na sequência. Só que vodka é um perigo pra mim, na metade da garrafa ela adormece todos os meus neurônios e fica apenas Tico e Teco batendo cabeça.

A lógica era óbvia, só tinha gay e uma falsa modelo na roda, o que fiz? Pois bem. Mal me lembro do que conversamos.

Acordei em casa com a garota do meu lado. Olhei meu celular e me senti no final do filme Hang Over, em que cada olhada de foto e mensagem revelava o que tinha acontecido.

Havia umas dez fotos com a garota como se fôssemos um casal há anos. Com meu amigo foi ainda mais bizarro. O casal brigou, o cara pegou um dos modelos (sim, “um”, e não “uma”) e meu amigo pegou a garota. Muita informação para meu cérebro ressaquento.

Olhei pro meu lado e a menina parecia um coala dopado. O olho estava todo borrado e a fronha de fio egípcio 400 fios (presente de uma peguete) manchada de preto. Fui tomar banho e fiz questão de colocar o som alto (gosto de ouvir música no banho) para que ela acordasse.

Sai do banheiro, o coala me deu bom dia e me perguntou se daria pra passarmos na casa dela antes de sairmos. Deu um friozinho na espinha. O bobo bêbado ficou apaixonadinho e convidou a garota para que me acompanhasse no passeio que faria por São Paulo no dia seguinte.

Eu nunca fui turista em São Paulo (exceto pelas idas à Sala São Paulo e nos Municipais) e seria uma vergonha ficar um ano fora do meu país e não conhecer as principais atrações da minha cidade natal. Naquele sábado tinha programado de ir ao Masp, Mosteiro São Bento, Praça da Sé, Largo do Arouche, subir no Altino Arantes, entre outros.

Depois de sair atrasado por conta da garota que ficou uma hora pra se arrumar, finalmente fomos ao Masp. Ela não se coçou para pagar a parte dela em nenhum momento, nem o estacionamento.

Finalmente entramos no Masp. Ela mostrou-se o tipo de pessoa inconveniente para ir em museus. Passava correndo por todas as obras e quando parava fazia pergunta idiota só pra mostrar um falso interesse. Somado a isso, ela tinha a fala mansa. Tudo que ela falava vinha na marcha 1, eu sou aceleradinho, aquilo me dava uma preguiça que não raro eu pedia que ela repetisse o que falava.

O ápice foi quando ela sumiu. Estávamos numa parte em que as obras ficam dispostas no meio da sala, sendo algumas com objetos do dia a dia. De repente ela apareceu do meu lado e alguns segundos depois o segurança. O cara puto da vida disse que não podíamos tocar nas obras. Levantei a voz e questionei em que momento eu tinha tocado em algo. O cara retrucou que a garota tinha levantado as garrafinhas de Coca-Cola. Fiquei vermelho e a garota com cara de bunda.

Dentro do carro ela pediu desculpas e assim segui a via sacra pelas atrações de São Paulo com a fala mansa do meu lado. Não bastasse a voz da garota, os assuntos eram chatíssimos. Ela ia passar um mês na França e não parava de falar da viagem um segundo. Só que nada era interessante, ela insistia em falar que Paris deveria “cheirar cultura”, que “respira-se romantismo” e demais frases clichês babacas. Tive vontade de pedir que ela ficasse quieta por um tempo, mas eu não consigo ser grosseiro com mulher. Só que acabei explodindo.

Já tínhamos visitado todas as atrações e eu estava dirigindo para deixar a garota na sua casa, quando ela resolveu do nada fuçar o suporte de óculos do meu carro e quebrou a parada. Ao invés de assumir, disse que já estava quebrado. Não aguentei e acabei cuspindo que nem minha prima de 8 anos daria tanto trabalho em um passeio por São Paulo. Resultado? A garota começou a chorar e eu me senti um merda.

Enfim, apesar desses desgastes, São Paulo é uma cidade que oferece muito mais que baladas e restaurantes. Esses lugares que mencionei são ótimas opções pra sair da rotina e levar um carinha. Claro, desde que não seja um mala (ou fala mansa, ao menos pra mim).

Dicas de vinho

Agora que finalmente chegou o inverno (exceto se você estiver no nordeste ou Cuiabá), nada como abrir um vinho com o _______ (coloque ai sua condição: namorado, caso, peguete, P.A, etc), esquentar internamente o corpo e depois externamente numa boa noite de sexo levemente embriagados.

Sou suspeito para falar de vinho, pois é uma das minhas grandes paixões ao lado de mulheres, viagens, livros, filmes, boxe e outras coisas. Diferente da cerveja, ele não me dá vontade de ir no banheiro a cada 5 minutos, o que incomoda um bocado na pegação; e diferente da vodka, ele não me deixa retardado.

Vinho bom é como mulher interessante, tem complexidade. Ao contrário da maioria das outras bebidas ou mulheres comuns, que são padronizados e rasos.

Por exemplo, pega algumas latinhas de cerveja Brahma. Elas são iguais as do ano passado, são iguais hoje e serão iguais as do ano que vem. Não é por isso que eu não tomo, as vezes vale tomar no boteco pra matar a sede e passar o tempo, assim como uma garota gostosa e sem personalidade.

Agora o vinho (por favor, não estou falando de Chapinha e etc) por mais que seja da mesma uva, pode ser completamente diferente um do outro. Há vários fatores que influenciam: como ele foi produzido, como envelheceu, a evolução depois de aberto, o potencial de guarda e por ai vai. Gosto não apenas de apreciá-lo, mas entender a sua história, assim como uma mulher interessante.

Posto isso, darei algumas sugestões de vinhos para você aproveitar com o seu _______ ou simplesmente para abrir sozinha, fazer uma pipoca e ver um bom filme. Que na real as vezes é até melhor que dividir com um tosco.

Dividirei a lista por faixa de preço e tipo. Vale um aviso aqui. Aquele papo de que vinho bom é vinho caro, é a maior estupidez. Geralmente quem fala isso, quer mostrar que está com o bolso cheio, mas tem a cabeça vazia.

Obviamente que há um valor mínimo pra comprar um vinho ok (R$ 15/20), porém na faixa de R$50,00 é possível encontrar excelentes opções. Evitei colocar descrições do tipo: Um vinho elegante, macio, com personalidade, estruturado, pois metade desses adjetivos é uma tremenda baboseira e mais confunde que ajuda na escolha pra quem não é familiarizado.

Outro ponto, eu não gosto de vinho leve (como Pinot Noir), por isso a minha lista só possui vinho bem encorpado (como Tannat e Malbec). Se não é seu estilo, esqueça a lista de tintos.

 Até R$ 50,00 – Tinto

Com exceção do Casa Venturini, é possível comprar todos nos principais supermercados.

Casillero Del Diablo Cabernet Sauvignon

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Casillero é um clássico do Pão de Açúcar. Quando quero comprar um vinho bom e estou sem tempo de ir em loja especializada, é ele quem salva. Preço R$ 31,90.

 

Casa Venturini Tannat

 

 

 

 

 

 

 

Esse eu faço uma menção honrosa. Um dos melhores vinhos brasileiros que já tomei. Você pode comprar na Bocatti (R$ 35,90).

 

Ventisquero Reserva Cabernet Sauvignon

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Nunca tomei um vinho ruim dessa vinícola. Esse é o vinho de entrada (Preço R$ 43,00), mas meu preferido deles é o Queulat.

 

Vinho Aurora Cabernet Sauvignon

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É o mais baratinho da lista. Geralmente compro esse vinho pra tomar durante a semana, ótima companhia pra ler e escrever. Vale o que você paga (Preço R$ 20,00), logo não espere um manjar dos deuses.

 

Até R$ 50,00 – Branco

 

Espumante Garibaldi Prosecco Brut

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Os espumantes brasileiros são bem conceituados lá fora. Esse recebeu vários prêmios e custa menos de R$30,00. Uma informação pra bancar a expert: para conhecer um bom espumante, observe as bolinhas (perlage) na taça, elas precisam ser pequenas e subir uniformemente. Preço R$ 25,40

 

 

Casillero sauvignon blanc

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Outra curiosidade, os vinhos brancos são produzidas com uvas vermelhas. Acontece que as cascas, responsáveis pela coloração do vinho, são retiradas do mosto antes que passem a cor. Sauvignon blanc chileno é um vinho bem fácil de beber e não exige comida, ao contrário dos Chardonnays, que são mais pesados. Preço R$ 44,00

 

De R$ 50,00 a R$ 100,00 – Tinto

 

Bouza Tannat

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Tannat, além da uva emblemática do Uruguai, é a mais saudável do mundo. Isso porque ele possui mais tanino (por isso o nome “Tannat”), um potente anti-oxidante. Ele é encontrado nas cascas das uvas (é aquele gosto amargo que prende a boca). É por isso que o branco não é tão saudável quanto o tinto, já que as cascas são retiradas na fermentação. Preço R$ 95,00 (vendido na Decanter)

 

De R$ 50,00 a R$ 100,00 – Branco

 

Chateau St Michelle Riesling

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Os Estados Unidos têm produzido kexcelentes vinhos. Lá é super barato, mas com o dólar e taxas, infelizmente chegam aqui custando uma pequena fortuna. Esse vinho parece um suco de pêssego. Bem gelado vai embora em meia hora. Preço R$ 95,00, na Winebrands.

 

Mais de R$ 100,00 – Tinto

Swinto Malbec

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Esse é um dos meus prediletos, quando faço a Cafarronada. Apenas para ocasiões bem especiais e com uma mulher que entende o mínimo de vinho. Preço R$ 168,00 na Adega Brasil.

 

Mais de R$ 100,00 – Branco

 

Palácio da brejoeira

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Para mim não tem melhor vinho branco que os verdes portugueses. Esse tem uma acidez que cai perfeito com um bom bacalhau. Preço R$ 148,00 na Casa Santa Luzia.

 

Bônus – Vinho suave

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Zinfandel branco – Se você só gosta de vinho suave (leia-se doce), vale a pena provar o White Zinfandel. O que eu gosto nesse estilo de vinho é que ao contrário de sangue de boi e chapinha, não é adicionado açúcar de cana. A doçura vem da própria uva, pois a fermentação é suspensa antes que o açúcar natural da fruta vire álcool. Preço R$ 64,00 na Todovino.

 

Finalizo com a dica de dois excelentes filmes sobre o assunto: O Julgamento de Paris e Sideways. Esse último agrada mais aos homens que mulheres, mas é um bom estudo da mente masculina.